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segunda-feira, 5 de outubro de 2009

JP PUBLICA TRECHOS DO LIVRO 'HONORÁVEIS BANDIDOS'

RETRATO DO BRASIL NA ERA SARNEY
José Sarney, Roseana, Jorge Murad, João Alberto e Ernane Sarney são dissecados pelo jornalista e escritor Palmério Dória
POR OSWALDO VIVIANI

Com autorização do autor, o Jornal Pequeno publica hoje trechos do livro “Honoráveis bandidos – Um retrato do Brasil na era Sarney”, do jornalista Palmério Dória. Lançado no dia 24 passado, em São Paulo, o livro já se transformou num best-seller instantâneo nos grandes centros do país. Em São Luís, estranhamente, o livro não está disponível em nenhuma livraria da cidade.
Sarney e Roseana: personagens destacados da obra de Palmério Dória
Reportagens do JP – como “Casa oficial de Sarney vira cassino de Roseana” e “Cadáveres da Operação Tigre assombram passado do vice de Roseana Sarney” (ambas de março deste ano) e “Grampo da PF comprova envolvimento de Ernane Sarney no escândalo Gautama” (de agosto de 2008) serviram de fonte de pesquisa para o autor traçar os perfis de personagens presentes em muitos momentos da história política (e policial...) passada e recente do Maranhão. Roseana Sarney, Jorge Murad, João Alberto de Souza e Ernane Sarney são os integrantes do clã dissecados nos textos publicados hoje – figuras de luz menor ou maior, mas sempre encobertas pela sombra dominadora do patriarca da família, José Sarney. Veja os textos.

RAINHA DO CALHAU É FISSURADA NO PANO VERDE

Quando Roseana deixou o Planalto [separada de Jorge Murad, no final da década de 1980, no fechar das portas do governo Sarney] e topou com o ex-namorado Carlos Henrique [Abreu Mendes, que foi secretário de Meio Ambiente no governo de Wellington Moreira Franco], estava deprimida.

Resolveu viajar, correr o mundo, divertir-se. E lá se foi para alguns dos lugares que ela mais ama: Monte Carlo, Atlantic City e Las Vegas.

Se você acha que essas cidades têm algo em comum, acertou: ela adora jogar. Diante do pano verde, seus olhos verdes se integram em perfeita simbiose. O girar da roleta, o tilintar das fichas, a voz do crupiê, a emoção da aposta, naquele ambiente esfumaçado, suprem-lhe qualquer deficiência emocional.

Isso já representou um trauma para a família, especialmente para José Sarney. Que, num discurso em 1993, chegou às lágrimas na tribuna do Senado, respondendo a uma nota da colunista Danuza Leão, que tratava das peripécias da moça por centros internacionais de carteado.

Às vezes, quando batia a fissura e não dava para atravessar o oceano, Roseana praticava uma espécie de política da boa vizinhança, prestigiando os cassinos do Paraguai. Ela, os irmãos e os amigos sempre puderam contar com o jatinho da família, um British Aerospace BAE 800, prefixo PP-ANA, registrado em nome de Mauro Fecury, suplente de Roseana no Senado e velho amigo de Sarney.
Roseana e Jorge Murad: casal coleciona falcatruas
Pai do deputado federal Clóvis Fecury, Mauro é dono do Centro Universitário Unieuro [Uniceuma, no Maranhão], com filial em Brasília. A família seria sócia nessa universidade, cuja biblioteca se chama Roseana Sarney. O reitor é Luiz Roberto Cury – marido de quem? De Emília Ribeiro, ex-assessora de Sarney que, como conselheira da Anatel por indicação do padrinho, deu o voto de desempate na fusão das empresas de telefonia Brasil Telecom e Oi, negócio de mais de R$ 5 bilhões – com o quê, a BrOi passou a dominar quase metade dos acessos de dados no país (42,41%).

Outras vezes, ao voltar das jogatinas para São Luís, batia na turma uma vontade irreprimível de comer na churrascaria Porcão, em Brasília. Os meninos mandavam o piloto aterrissar para matar a fome. Um desses pilotos que os levavam, antigo na aviação nacional, pediu demissão.

“O vôo de ida e volta de São Luís para Assunção não era nada perto desses, digamos, pousos de emergência”, diz ele, pedindo para não revelar o nome.

Ele quis dizer o seguinte: o pouso inesperado de um jatinho num aeroporto internacional, com o custo operacional completo, reabastecimento, aluguel de hangar etc., sai mais caro que o vôo São Luís-Assunção em si. O veterano piloto não suportou tais descalabros, foi embora.

Dizem os amigos que, se os adversários de Roseana soubessem de sua obsessão pela jogatina, poderiam fazer bom uso, porque ela seria capaz de largar tudo por uma mesa de pif-paf. Não deve ser exagero. Por causa dessa insana paixão, Roseana abriu a temporada de escândalos com passagens aéreas no Congresso.

Deu no Jornal Pequeno, combativo diário de São Luís do Maranhão, edição de 15 de março de 2009:

“Maratona de jogatina reuniu pelo menos 10 pessoas. Roseana Sarney admite que 4 viajaram de São Luís a Brasília com sua cota no Senado.”

A moça é realmente da pá virada. Um mês depois que o pai virou presidente do senado, ela transformou a residência oficial da Presidência daquela Casa em cassino. Com carinha de inocente, quando o resto da mídia “descobriu” a farra, ela disse que passaram o sábado e o domingo em “reunião de trabalho”.

No passado o dolce far niente internacional pelas rodas de carteado era bancado por um cartão de crédito com fundos ilimitados, emitido por um banco de Miami, o Schroder, segundo denúncia do Jornal do Brasil e da revista Exame. Dono da conta responsável pelo débito mensal desse cartão da felicidade: Edemar Cid Ferreira. Padrinho de casamento de Roseana e Jorge Murad, na Catedral da Sé, em São Luís, em 1976, onde Edemar conheceu a futura mulher [Márcia Costa].

Roseana e Jorge, por sua vez, viriam a se tornar padrinhos de casamento de Edemar e Márcia. Filha de quem? Daquele senador Alexandre Costa, lembram-se? Um dos que estavam metidos no famoso rolo da gráfica do senado, em 1994 (esse político, famoso por sua violência, com base eleitoral na cidade interiorana de Caxias, morreria em 1998).

Márcia é a maior amiga de Roseana, que – não se esqueçam – também estava naquele mesmo rolo. É no ombro de Márcia que Roseana vai chorar mágoas, na mansão de R$ 142 milhões do casal, no chique bairro paulistano de Cidade Jardim, vizinhos dos igualmente banqueiro Joseph Safra e do megaempresário Antônio Ermírio de Morais.
(Páginas 80, 81 e 82 de “Honoráveis Bandidos”)
UMA BOQUINHA PARA O TIO GAGUINHO
Shirley e Ernane: casal no fio da ‘Navalha’
Aqueles atípicos 2 milhões [sacados por Fernando Sarney da conta da Mirante às vésperas do 2º turno das eleições para governador que Roseana Sarney perdeu, em 2006] deveriam turbinar a campanha de Roseana. E a quem as togas cassarão, dois anos depois, por “abuso de poder econômico”? O vencedor das eleições, o médico Jackson Lago. Roseana, e com ela personagens que vão e vêm, tal qual nos filmes eternamente repetidos nas sessões da tarde da televisão. Gaguinho é um deles.

No centro histórico de São Luís, dois do povo conversam:
“Qual a pior coisa do Maranhão?
A família Sarney.
Qual a melhor coisa do Maranhão?
Ser da família Sarney”.

Pois então, Roseana mal retoma “seu” Maranhão, e já leva o tio, Ernane Sarney, velho faz-tudo dela, para a Casa Civil, mesmo envolvido até o pescoço na Operação Navalha.

Grampo” da Polícia Federal, realizado em março de 2007, capta titio cobrando propina que a construtora Gautama lhe devia. A Operação Navalha desmontaria, dois meses depois, um esquema de fraudes em licitações de obras públicas. A conversa se deu entre Ernane César Sarney Costa, o Gaguinho, irmão do coronel e secretário particular de Roseana, e na outra ponta da linha Gil Jacó Carvalho Santos, tesoureiro da Gautama, empreiteira de Zuleido Veras. Gil Jacó era quem pagava as propinas e foi um dos 61 denunciados pelo Ministério Público Federal no Superior Tribunal de Justiça.

O Jornal Pequeno, de São Luís, teve acesso ao diálogo interceptado e publicou trechos na edição de 24 de agosto de 2008.

Segundo o repórter Oswaldo Viviani, Ernane cobra de forma agressiva o pagamento, diz que está “com a corda no pescoço” e que “o pessoal aqui também tá com a corda no pescoço”, o que leva a crer que não é o único beneficiado:

“Você disse que ia pagar, rapaz! Já tava tudo na mão, eu não sei o que tá acontecendo. Tão me enrolando”, diz Ernane. “Tava na mão, tava na mão. Só conversa, rapaz. Eita, porra!”, explode o tio de Roseana e seu futuro aspone na Casa Civil, exigindo: “Rapaz, fala com ele! Bota isso em prioridade”. Ele, segundo a reportagem, é o chefão da Gautama, Zuleido Veras.

A Gautama depositou dinheiro na conta da mulher e do filho de titio Ernane. A mulher é Shirley Duarte Pinto de Araújo, assessora do Senado lotada no gabinete de Roseana; o filho é Ricardo Sarney.

Nos depósitos para Shirley, a Gautama tratou de evitar o valor de R$ 10 mil em cada operação para fugir à fiscalização. Em 7 de abril de 2006, depositou R$ 9.950, às 15h20, e cinco minutos depois, mais cinquentinha que faltavam.

Depósitos e diálogos comprometedores, lembra o Jornal Pequeno, somam-se a outros indícios de envolvimento do clã Sarney com as fraudes da Gautama, que a revista Veja revelou em junho de 2008. Ali, uma agenda de Zuleido Veras, apreendida em maio de 2007, contém a anotação do nome de Roseana ao lado da quantia de R$ 200 mil, dois meses antes da eleição para o governo do Maranhão, na qual ela (ainda no PFL, depois DEM) perdeu para o pedetista Jackson Lago.

Na mesma agenda, Roseana aparece numa anotação, a 14 de abril, ao lado da cifra de R$ 63 milhões.

Gaguinho, ou titio Ernane, Roseana nomeou chefe da Assessoria de Programas Especiais da Casa Civil. Ou seja, não precisa fazer nada, não, se não quiser. Uma sinecura.
(Páginas 109, 110 e 111 de “Honoráveis Bandidos”)

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