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segunda-feira, 31 de agosto de 2009

OBRA DO INTERLEGIS FOI SUPERFATURADA, DIZ MPF

Ação do Ministério Público Federal denuncia desvio de R$ 4,7 milhões na construção de prédio do Senado. Criação do espaço que custou mais de R$ 9 milhões foi autorizada por ato secreto.

Lúcio Lambranho e Fábio Góis

A construção do prédio do Interlegis no Senado foi superfaturada em R$ 4,7 milhões, segundo denúncia do Ministério Público Federal (MPF) que aguarda decisão da Justiça Federal em Brasília desde agosto de 2004. A ação civil pública, à qual o Congresso em Foco teve acesso com exclusividade, tem como réus a construtora Delta Engenharia, vencedora da licitação, e as empreiteiras Via Engenharia e Contarpp Engenharia, subcontratadas para tocar a obra, e seus respectivos responsáveis.

Também foi denunciada a ex-diretora do Prodasen Regina Célia Peres Borges, personagem conhecida como autora da violação do painel do Senado que resultou na renúncia, em 2001, dos senadores Antonio Carlos Magalhães (falecido) e José Roberto Arruda, atual governador do Distrito Federal. Embora Regina tenha assinado os cinco aditivos do contrato com a Delta que deram origem à denúncia superfaturamento, o juiz responsável pelo caso resolveu deixar a análise sobre a responsabilidade da ex-funcionária para o fim do processo.

"Tenho por, de bom alvitre, no presente momento, receber a presente ação somente em relação às pessoas jurídicas e seus sócios ou prepostos, postergando a apreciação quanto a eventual responsabilidade da ex-diretora do Prodasen para quando do advento das contestações", diz o juiz Francisco Neves da Cunha, da 16ª Vara Federal no Distrito Federal, em decisão de 20 de setembro de 2006.


No Senado, a polêmica que a obra gerou entre agosto de 2000 e junho de 2001 parece ter sido esquecida. O atual primeiro-secretário da Casa, Heráclito Fortes (DEM-PI), responsável pelas ações do Interlegis, disse por meio de sua assessoria que não sabia da existência da ação. Foi o próprio Heráclito que denunciou ao jornal O Globo, no último dia 13, que a construção do prédio, junto com uma reforma nas instalações do Prodasen, também foi autorizada por atos secretos.

"Fraude é cristalina"

A denúncia protocolada na Justiça Federal em agosto de 2004 pelo procurador da República Luiz Francisco de Souza afirma que a licitação foi feita de forma ilícita e, a construção do prédio, superfaturada pelos cinco aditivos ao contrato. O documento é baseado em perícia de técnicos da Caixa Econômica Federal.

Segundo a perícia, a obra teve um acréscimo de 39% sobre o valor do contrato, o que também contraria a Lei de Licitações, que só permite o aumento de até 25%. Os cinco aditivos não deveriam ter sido aceitos pela Senado, segundo a auditoria da Caixa que fez o trabalho a pedido do procurador da República.

Além desses dois pontos, o procurador questiona a subcontração das outras empresas por meio da criação da Sociedade Guará. A sociedade, criada no mesmo dia em que a Delta assinou o contrato com o Prodasen, exigia das demais empresas cláusula de sigilo. "A fraude é cristalina. Os réus e as autoridades coniventes devem ser punidas com as sanções previstas na Lei de Improbidade. Trata-se de uma subcontratação clandestina e ilícita, sem a anuência do poder contratante", diz o texto da ação.

Aposentada há oito anos pelo Senado, a ex-diretora do Prodasen defende a obra e se diz inocente. "Que Deus faça Justiça pela primeira vez. Eu espero que um dia a Justiça seja feita. Não sei o porquê dessa denúncia, já que o prédio foi construído em tempo recorde e com alta qualidade", disse Regina Célia ao Congresso em Foco.

Subcontratações são comuns em obras públicas, mas precisam estar previstas no edital de concorrência ou no contrato entre a administração e as empreiteiras. É o que prevê a Lei de Licitações. O contrato entre a Delta e o Prodasen não permitia subcontratações. A questão também foi observada pelo juiz que recebeu a denúncia em 2006. "Tal fato, neste exame preliminar, não se afigura irrelevante, sendo digno de acurado exame, que terá lugar no curso do processo", afirma o magistrado na sua decisão de 2006.

A questão também foi destacada pelo procurador da República Rômulo Conrado que reafirmou a denúncia do colega Luiz Francisco em parecer sobre a denúncia em maio de 2008. Conrado afirma que a sociedade teve caráter ilegal, pois uma das subcontratadas, a Via Engenharia, ofereceu proposta para a mesma licitação. "Não se pode olvidar, nesse sentido, haver a empresa Via Engenharia S.A constituído sociedade com outra empresa com a qual concorreu em processo licitatório, para a execução de obra de vulto, sem que tenha se sagrado vencedora do certame", diz o parecer do procurador.

Apesar de não ter sido retirada formalmente da denúncia, Regina Célia garante que o juiz aceitou os argumentos do seu advogado e que ela não figura mais como ré do processo. A ex-diretora do Prodasen ainda tem contra ela outra denúncia formulada pelo Ministério Público Federal (MPF).

"Omissão"

Regina é alvo de outra ação civil pública, também por ato de improbidade administrativa, na 14ª Vara da Justiça Federal em Brasília, juntamente com outros cinco servidores do Senado e a empresa Aceco Produtos para Escritório e Informática Ltda. Como na denúncia de superfaturamento do prédio do Interlegis, os procuradores Bruno Acioli, Vinícius Fermino e Eliana Pires da Rocha questionam os aditivos de contrato com a Aceco.

Os aditivos, segundo a denúncia, permitiram a compra de produtos para o Prodasen que não estavam previstos no edital. O MPF pede a devolução dos cofres públicos de R$ 984 mil reais. O valor equivale à soma das compras feitas pelos três aditivos no contrato.

Para o procurador (leia mais sobre ele), a ex-diretora do Prodasen tem responsabilidade pelo suposto superfaturamento das obras do Interlegis. Em entrevista ao Congresso em Foco, Luiz Francisco afirmou que a exclusão da ex-servidora do processo enfraquece sua denúncia. Segundo ele, o crime de improbidade administrativa só poderá ser configurado se a participação da então diretora do Prodasen for considerada pelo magistrado. "No mínimo, houve uma omissão da diretora que assinou todos os aditivos do contrato e que deram prejuízo ao erário. Só isso já basta para que a diretora seja enquadrada no crime de improbidade administrativa", diz Luiz Francisco.

O procurador acredita que a obra do Interlegis é um dos símbolos da falta de transparência da Casa. "Na época, tudo já era secreto no Senado, menos justamente o painel que foi violado e manipulado enquanto deveria ser secreto. A única maneira de dar transparência na casa que deveria ser de vidro e é de trevas é uma CPI do Senado. Todos os atos do Prodasen e que criaram o Interlegis deveriam ser investigados profundamente. Essa ação mostra apenas um pouco disso", completa Luiz Francisco.

Os réus se defendem

"Foi uma licitação que teve diversos problemas políticos. Sinceramente não sei quais foram esses problemas políticos. Foi uma briga interna no Senado. Uma obra baratíssima e a empresa não ganhou nada. Obra complicada e que tinha que ser feita em tempo recorde de cinco meses por que eles queriam fazer logo a inauguração", justifica um dos sócios da Delta, Cícero de Noronha Barros.

Ele é um dos réus da ação, ao lado do irmão Daltro Noronha Barros, outro sócio da empresa vencedora da licitação, e de Fernando Costa Gontijo, então diretor da Via Engenharia, e Paulo Roberto Perez de Almeida, sócio da construtora Contarpp Engenharia. A Via e a Contarpp foram subcontratadas.

A denúncia contraria a versão de Cícero sobre o tempo de entrega da obras. A obra foi recebida no dia 27 de junho de 2001, mas os trabalhos começaram no dia 4 de agosto de 2000. "A conclusão estava prevista para acontecer em 180 dias, portanto em 30 de janeiro de 2001, quase cinco meses depois da data contratada", diz a denúncia de Luiz Francisco. Sobre a subcontração das outras empresas, Cícero de Noronha alega que "nenhuma obra é feita sem a contração de outras empresas".

A Via Engenharia disse por meio de sua assessoria de imprensa que não iria se pronunciar sobre o processo por força do contrato estabelecido com a Delta de não se posicionar sobre o caso. A Contarpp Engenharia não retornou o pedido de entrevista feito pela reportagem na última quarta-feira (25).

A Almeida França Engenharia, que também participou da obra e faz parte da Sociedade Guará, alega que foi retirada do processo após a apresentação da sua defesa perante o juiz responsável pelo caso. De fato, ao aceitar a denúncia, o juiz não cita a empresa nas suas alegações finais, apesar de a construtora fazer parte da denúncia do MPF.

"Após apresentação de nossa defesa, fomos excluídos da ação mencionada. Assim sendo, não estamos habilitados a fornecer qualquer versão sobre dita ação e seus desdobramentos. Esclarecemos, todavia, que executamos ali a instalação do sistema de ar condicionado (nossa especialidade), na qualidade de empresa subcontratada", afirma o sócio da empresa Eduardo de Almeida França, em mensagem enviada ao Congresso em Foco.


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